"A Educação do Homem começa no momento do seu nascimento; antes de falar, antes de entender, já se instrui."
Jean Jacques Rousseau

domingo, 5 de maio de 2013

PLANO DE AULA PARA ALUNOS DO ENSINO MÉDIO


Poesia trovadoresca e sua relação com a música popular

  

Objetivo

- apresentar a poesia trovadoresca e suas características de forma e conteúdo;
- identificar a estreita relação da poesia trovadoresca com a música e reconhecer os efeitos de sentido decorrentes desta relação;
- relacionar a poesia trovadoresca com a música popular contemporânea e identificar as possíveis semelhanças temáticas e formais. 
 

Duração das atividades

- 4 aulas  

Organização da sala

- pequenos grupos de alunos que pesquisarão e discutirão sobre o tema. 

 Recursos didáticos

- Conhecimentos prévios trabalhados pelo professor com os alunos. 
- Habilidades básicas de leitura e escrita.
- Conhecimento histórico sobre o período trovadoresco.
- Utilização do laboratório de informática e da biblioteca. 
 

Desenvolvimento das atividades


1ª aula


Para a primeira atividade apresentar para os alunos as imagens abaixo, disponíveis nos respectivos sites:



Iluminura das Cantigas de Santa Maria (Ms. escurialense)

 

Solicitar para que levantem hipóteses sobre a origem dessas imagens e sobre quem podem ser esses indivíduos representados nelas.
Após as hipóteses, espera-se que os alunos, ao menos, aproximem seus apontamentos em relação ao período histórico, a Idade Média, por causa das vestes e das características dos instrumentos musicais. Em relação ao papel dos indivíduos retratados na imagem, provavelmente, os alunos irão defini-los como músicos, devido aos instrumentos empunhados por eles e às pautas inscritas ao fundo na segunda imagem.
Tendo em vista essa relação apresentar a seguinte questão para um debate:
O que esses homens têm a ver com a poesia?
No princípio pode sobressair a dúvida, por não haver referências na imagem à linguagem poética, principalmente a escrita, mas aos poucos deve inserir elementos com algumas dicas históricas, como o questionamento sobre a definição de "trova", para que os alunos compreendam que esses cantadores também eram poetas, muitas vezes mais poetas do que músicos.
Mais uma vez o estimular os alunos a demonstrar seus conhecimentos históricos, perguntando, por exemplo, o que sabem sobre trovadores, vates e menestréis?
Levá-los para o laboratório de informática ou biblioteca para que consultem alguma enciclopédia para o esclarecimento de quem foram esses cantadores e do contexto em que viviam.
Daí ficará esclarecido que trovadores, vates e menestréis eram os cantadores, que portando instrumentos como o alaúde, a lira, a flauta, e outros, levavam para a corte, e mesmo para os plebeus, na Idade Média, o conhecimento de histórias de outros reinos e lugares distantes, além da expressão sentimental de seus versos cantados.
É importante que fique claro para os alunos que a poesia na época dos trovadores era oral, sendo registrada apenas mais tarde em cancioneiros, e por isso era acompanhada da música para facilitar a continuidade do ritmo e a memorização dos textos. Consequentemente, esses poemas cantados passaram a ser chamados cantigas.
As cantigas, geralmente, eram acompanhadas por um coro e por instrumentos musicais. Seu público não era constituído de leitores, mas de ouvintes. Era, portanto, poesia intimamente ligada à música, própria para apresentações coletivas.
As cantigas compostas pelos trovadores eram musicadas e interpretadas pelos jograis, pelo segrel e pelo menestrel (gente humilde que sobrevivia cantando em público), artistas agregados às cortes ou que perambulavam pelas cidades e feiras. Os trovadores eram quase sempre de origem nobre.
Após essas informações contextuais, adquiridas com a pesquisa, a classe pode chegar a uma conclusão sobre as características das cantigas. Dividir a sala em grupos e pedir que exponham para os colegas os dados coletados na pesquisa, além da conclusão de cada grupo.

2ª aula


Para a segunda atividade apresentar para os alunos as características dos gêneros das cantigas:
Lírico (amor e amigo) e Satírico (escárnio e maldizer).
As cantigas de escárnio e maldizer são a primeira manifestação da sátira na literatura portuguesa. Menos presas a modelos e convenções do que as cantigas de amigo e de amor, as cantigas satíricas buscaram um caminho poético próprio voltando-se para a crítica dos costumes, tendo como alvo diferentes personalidades da sociedade portuguesa: clérigos devassos, cavaleiros e nobres covardes, prostitutas, alguns trovadores e jograis, as soldadeiras (mulheres que cantavam e dançavam durante as apresentações). Há uma pequena diferença entre esses dois tipos de cantiga: enquanto na cantiga de escárnio o nome da pessoa satirizada não é revelada, na cantiga de maldizer fica claro para quem é a sátira, sendo a linguagem da segunda mais direta e obscena.
Para esta aula, é necessário dar mais atenção às cantigas de amor e de amigo.
Abaixo um exemplo de cantiga de amigo onde o trovador Julião Bolseiro, o diálogo se estabelece entre a mulher apaixonada e sua filha, que impede a mãe de ver seu amado:

Mal me tragedes, ai filha,
porque quer ‘ aver amigo
e pois eu com vosso medo
non o ei, nen é comigo,
no ajade-la mia graça
e dê-vos Deus, ai mia filha,
filha que vos assi faça,
filha que vos assi faça.


Sabedes ca sen amigo
nunca foi molher viçosa,
e, porque mi-o non leixades
ver, mia filha fremosa,
no ajade-la mia graça
e dê-vos Deus, ai mia filha,
filha que vos assi faça,
filha que vos assi faça.

Pois eu non ei meu amigo,
non ei ren do que desejo,
mais, pois que mi por vós v~eo
Mia filha, que o non vejo,
no ajade-la mia graça
e dê-vos Deus, ai mia filha,
filha que vos assi faça,
filha que vos assi faça.

Por vós perdi meu amigo,
por que gran coita padesco,
e, pois que mi-o vós tolhestes
e melhor ca vós paresco
no ajade-la mia graça
e dê-vos Deus, ai mia filha,
filha que vos assi faça,
filha que vos assi faça

Solicitar aos alunos, após a leitura da cantiga que apontem seus elementos característicos,sendo: temática; eu lírico; forma paralelística; refrão.
A temática das cantigas de amigo é variada:

(a) a separação do namorado, que parte em alguma expedição militar e a espera de seu retorno;
(b) a romaria a lugares santos, onde a donzela busca uma conquista amorosa, através da dança;
(c) as bailadas, que versam exclusivamente o tema da dança;
(d) as marinhas ou barcarolas, à beira do mar;
(e) o tema das tecedeiras, no interior dos lares;
(f) e o tema das chamadas cantigas de fonte, onde as donzelas iam lavar os cabelos ou mesmo a roupa, encontrando-se então com os namorados.

Em alguns casos, os temas se confundem, há uma fusão. Na forma paralelística da cantiga de amigo, a unidade rítmica não é a estrofe, mas o par de estrofes ou o par de dísticos (dois versos). Ambos os dísticos dizem a mesma coisa, diferindo quase só nas palavras em rima. O último verso de cada estrofe, quase sempre, é o primeiro verso das estrofes no par seguinte. Assim, nessa estrutura paralelística, observa-se que os versos de um par de estrofes se repetem no outro par sem sofrer alteração de sentido, somente na forma se alteram, e são seguidos de refrão, como no exemplo.

Abaixo uma cantiga de amor do século XIII, do trovador Joan Garcia de Guilhade:

Amigos, non poss’eu negar
a gram coita que d’amor hei,
ca me vejo sandeu andar,
e com sandece o direi:
os olhos verdes que eu vi
me fazem ora andar assi.
Pero quenquer x’entenderá
aquestes olhos quaes som,
e d’est alguem se queixará,
mais eu, já quer moiro ou non:
os olhos verdes que eu vi
me fazem ora andar assi.
Pero non devi’ a perder
home que já o sem non há,
de com sandece rem dizer,
e com sandece dig’ eu já;
os olhos verdes que eu vi
me fazem ora andar assi.

Após a leitura da cantiga, solicitar aos alunos que apontem no caderno os elementos característicos das cantigas de amor: temática; eu lírico; expressão do amor cortês

3ª aula


Antes de apresentar alguns textos de nossa música popular, que trazem as características das cantigas trovadorescas, mostrar aos alunos a imagem do "Violeiro" (1899), do pintor Almeida Júnior. Solicitar que destaquem algumas particularidades da imagem:
O que faz o homem ao centro?
Para quem ele dirige sua cantiga?
Em que ambiente ele se encontra (urbano ou rural)?


Após a participação dos alunos, explicar qual a relação entre o meio rural, o caipira, seu violão e sua amada.
O violeiro é um cantador solitário como eram os trovadores e menestréis e é com sua cantiga que se comunica com a amada (senhora). Salvo as diferenças culturais e históricas, podemos perceber as semelhanças entre esse cantador sertanejo e os poetas trovadores (principalmente o das cantigas de amigo, que tematizam a simplicidade do ambiente campestre e a cultura popular, embora este eu lírico seja geralmente feminino, cabendo ao eu lírico masculino a expressão nas cantigas de amor).
Na nossa música popular também ocorrem algumas manifestações desses cantadores que se assemelham aos trovadores. Alguns deles são fiéis à estrutura de composição, à temática medieval e a uma variante arcaica ou regionalista da língua, com termos de pouco uso contemporâneo, sobretudo nos ambientes urbanos. Isso faz com que suas cantigas estejam muito próximas das medievais, considerando a distância temporal de 1000 anos, ao mesmo tempo que são um exemplo típico da cultura do sertão brasileiro.
Um dos maiores exemplos da tradição do cantador, na atualidade, é Elomar Figueira de Melo.
Abaixo a canção "O Violêro", que expressa muito bem qual a função do "errante" dessa "mudernage". Após se apresentar, revelar sua crença religiosa e dizer que já cantou em um castelo (referências ao medievalismo), o trovador ressalta que o que mais vale para ele é a música, a liberdade e o amor: "viola, furria, amô, dinhêro não". É o que canta até o fim, independente de sua penúria: "sem um tustão na cuia u cantadô/ canta inté morrê o bem do amô".

O Violêro

Vô cantá no canturi primero
as coisa lá da minha mudernage
qui mi fizero errante e violêro
eu falo séro i num é vadiage
i pra você qui agora está mi ôvino
juro inté pelo Santo Minino
Vige Maria qui ôve o qui eu digo
si fô mintira mi manda um castigo
Apois pro cantadô i violero
só hai treis coisa nesse mundo vão
amô, furria, viola, nunca dinhêro
viola, furria, amô, dinhêro não
Cantadô di trovas i martelo
di gabinete, ligêra i moirão
ai cantadô já curri o mundo intêro
já inté cantei nas portas di um castelo
dum rei qui si chamava di Juão
pode acriditá meu companhêro
dispois di tê cantado u dia intêro
o rei mi disse fica, eu disse não
Si eu tivesse di vivê obrigado
um dia inantes dêsse dia eu morro
Deus feis os homi e os bicho tudo fôrro
já vi iscrito no Livro Sagrado
qui a vida nessa terra é u'a passage
i cada um leva um fardo pesado
é um insinamento qui derna a mudernage
eu trago bem dent' do coração guardado
Tive muita dô di num tê nada
pensano qui êsse mundo é tud'tê
mais só dispois di pená pelas istrada
beleza na pobreza é qui vim vê
vim vê na procissão u Lôvado-seja
i o malassombro das casa abandonada
côro di cego nas porta das igreja
i o êrmo da solidão das istrada
Pispiano tudo du cumêço
eu vô mostrá como faiz o pachola
qui inforca u pescoço da viola
rivira toda moda pelo avêsso
i sem arrepará si é noite ou dia
vai longe cantá o bem da furria
sem um tustão na cuia u cantadô
canta inté morrê o bem do amô.


 

4ª aula


Após a apresentação do artista realizada na terceira aula, instrua os alunos a pesquisar na internet sobre a figura de Elomar, basta uma busca rápida para encontrar o sítio, ou melhor, a "porteira" do cantador e lá terão matéria para uma pesquisa mais que confiável. Link: http://www.elomar.com.br/
Instrua os alunos a fazer uma análise comparativa entre as cantigas trovadorescas e essa manifestação semelhante na nossa música popular e verdadeiramente sertaneja.
Após a atividade de escuta, leitura e análise os grupos deverão apresentar suas conclusões sobre a aproximação entre a música popular brasileira e a poesia trovadoresca.

 

Avaliação


Para a avaliação podem ser explorados os exemplos das cantigas de Elomar. Divida-as em grupos de alunos solicitando para que pesquisem em algum site onde é possível baixar músicas e depois de ouvir e ler as cantigas, cada grupo deve apresentar para o restante da turma apontando os aspectos que as fazem semelhantes às cantigas dos trovadores medievais.
A atividade permitirá não só o estudo de um gênero poético importante, pois trata-se das origens de nossa poesia e de nossa língua portuguesa, além da exploração da relação muito íntima entre a música e a poesia. Este aspecto permite entender o valor de artistas como Elomar, que mantém viva essa tradição medieval dos cantadores e menestréis, mesmo que modificada pelo tempo, e que nos leva a tocar as raízes de um de nossos troncos culturais.
 

Atividades complementares ao longo do ano letivo:


Programar atividades de ida ao laboratório de informática e à biblioteca ao longo do ano, para pesquisa de novas e maiores informações sobre o Trovadorismo, sempre trabalhando com a sala a Sondagem Diagnóstica em Roda de Conversa, expondo seu conhecimento histórico sobre o período trovadoresco e exclarecendo as dúvidas dos alunos.

 

Bibliografia:  


UOL. Português . Disponível em:<http://educacao.uol.com.br/disciplinas/portugues/trovadorismo---poesia-cantigas-de-amor-de-amigo-e-de-escarnio-e-maldizer.htm>. Acesso em: 01 mai. 2013

BRASIL ESCOLA. Literatura. Disponível em: <http://www.brasilescola.com/literatura/trovadorismo.htm>.Acesso em: 01 mai. 2013

INFO ESCOLA. Movimentos Culturais. Disponível em: <http://www.infoescola.com/movimentos-culturais/trovadorismo/>. Acesso em: 01 mai. 2013

MEC. Ficha Tecnica Aula. Disponível em: <http://portaldoprofessorhmg.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=37295>. Acesso em: 01 mai. 2013

RICARDO COSTA. Textos Trovadorismo. Disponível em: <http://www.ricardocosta.com/textos/guilherme2.htm >. Acesso em: 01 mai. 2013

ELOMAR. Discografia. Disponível em: <http://www.elomar.com.br/discografia/letras/violero.html >. Acesso em: 01 mai. 2013

ELOMAR. Disponível em:<http://www.elomar.com.br/ >. Acesso em: 01 mai. 2013

CECAC. Artes. Disponível em: <http://www.cecac.org.br/Artes_Almeida_Jr.htm >. Acesso em: 01 mai. 2013
 Postado por Edna M. Borges em 05/05/13 - 12h:58m
 

2 comentários:

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